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quinta-feira, março 26, 2009

Pornografia, Identidade, Intimidade


Décadas atrás, o compositor e biólogo Paulo Vanzolini escreveu a canção Praça Clóvis contando a historia de alguém que teve sua carteira roubada junto à foto de uma ex-namorada. “Na Praça Clóvis minha carteira foi batida/ Tinha 25 cruzeiros e o seu retrato/ 25 eu francamente achei barato/ pra me livrar daquele atraso de vida (...)” disse a letra, se eternizando no cancioneiro do samba paulista.
Nesta terça-feira, padeci do mesmo mal em frente a uma praça aqui na Lapa. Um motoqueiro levou meu celular e minha carteira. Tinha tudo dentro dela: RG, CPF, carteira de habilitação, etc.
Neste movimento de reaver minhas documentações, precisei fazer uma busca pela internet para descobrir a melhor maneira de fazer coisas como boletim de ocorrência, pedidos de segunda via, cancelamento de cartões e tudo mais.
Ao abrir uma página pelo Google, havia a notícia de que um vídeo de sexo com uma participante de um reality show havia sido espalhado pela internet. O vídeo estava na memória de uma celular roubado meses antes da notoriedade precária da moça.
Todo este panorama me fez pensar sobre coisas como memória, identidade, intimidade e pornografia.
Meu celular portava fotos da cidade apenas. Pedirei hoje a segunda via de minha identidade. O ladrão ficou com todo meu registro oficial, do dia em que eu nasci até o lugar onde eu voto. Mas o que ele levou não importa realmente, vão-se os anéis. O que importa é o que ele deixou em mim, algo entre raiva, dúvida e medo.
Eu não poderia agora narrar o que eu senti na coisa toda. Aí eu teria que falar do lugar de minha intimidade, e intimidade é tudo aquilo que não pode ser acessado por narrativas, fotografias ou vídeos pessoais.
Intimidade tem a ver com a memória de sentimentos que temos ou que pudemos outrora compartilhar com pessoas. Uma dor, um olhar, um gemido, coisas que só podem ser compreendidas interiormente. A narrativa destes eventos “pornografiza” as experiências. Como homens que traduzem suas aventuras sexuais em detalhes sórdidos aos amigos, para mostrar sua potência masculina de garanhão metropolitano (atire a primeira pedra quem nunca fez estas tolices). No momento em que se transpõe uma experiência a uma narrativa ou a um artefato de consumo, têm-se a pornografia.
Mas a intimidade, esta não será jamais tocada por tais recursos. A intimidade é o que fica em nós.
Não está em um corpo nu, mas no arrepio da pele.
A intimidade não é o fato, mas aquilo que dele me fere.
A intimidade não é o que eu escrevo, mas o que você é capaz de compreender.
A intimidade é o contrário da pornografia.
Não se pode pedir a segunda via de nossa intimidade.
Na Praça Marcelino Bressiani, minha carteira foi batida. Não tinha nenhum dinheiro, nenhum retrato.

(texto e desenho: Chuí)

domingo, março 15, 2009

Sobre isso (que vem)


Às vezes vem na forma de um sonho.
Noutras, é somente um calafrio.

Não chega a ser mediado por algum recurso verbal.
Não tem sintática nem pragmática.
Só serve pra confundir a semântica.
Pode nem ser uma imagem clara na mente. Mas você sabe.
No fundo você sabe quando vem.

A medicina chamaria de dor.
Exotéricos diriam que é presságio.
Céticos, que é gastrite, intuição no máximo.

Se fosse impulso, seria elétrico.
Se fosse música, seria dodecafônica.
Se fosse um objeto, seria sirene.

O fato é que vem de diversas formas,
e é sinal de que algo fatalmente
vai virar a sua vida pelo avesso.
Ou pior: que você não vai mais poder virá-la do avesso
(como secretamente você deseja há tantos anos ).

Quando vem, o melhor é olhar de frente.
No olho, engolir as vírgulas.

Senão depois não vai adiantar reparar, refletir, calcular os danos.
Foi-se(ou foice): É o tal leite derramado.

Você pode até fingir que não vê,
que não ouve e nem sente nada.
Você pode ter aprendido a não dar bola pra essas coisas.

Mas é certo, meu caro: não vem à toa.


(Texto e desenho de Chuí - clique na imagem para ampliá-la)

terça-feira, março 03, 2009

Nesta Quinta: A Volta do Blues do Samba


Amigos,
Na correria e meio atrasado, aqui vai um convite especial:
O Samblues está de volta nesta quinta no Centro Lírico Literário IX de Novembro. Será a partir das 21:00hs, na Alameda Tietê, 90. É um bar genial que mais parece uma linda casa ou uma casa genial que mais parece um lindo bar. Só por conhecer o lugar já vale a pena...
Eu - Chuí- junto com a gaita mágica de Guappo e a guitarra bluesmaster de Danny Vincent. O blues se une novamente ao samba - legítimos filhos da dor e pais do prazer, como naquela canção sobre a solidão -, revivendo Cartola, Louis Armstrong, Noel, Rufus Thomas, Nelson Cavaquinho, Ray Charles, Adoniran, etc, etc, todos em roupagens novas e sempre diferentes.
Eu confesso que andava com saudades dessas dores lindas.
Espero muito poder tê-los por lá!
Beijos a todos,
Chuí

(ilustração: Chuí - sobre desenho realizado ao vivo no espetáculo Dom do Ciúme)

Local: Centro Lírico Literário IX de Novembro
Alameda Tietê 90 - casa 03
Tel. 3085-8715
centroliricoeliterario@yahoogrupos.com.br